Manoel de Barros, o eterno poeta

Reportagem publicada no site Alô Caarapó em 18 de agosto de 2013.

Por Bosco Martins*

Ele reinventou a poesia e foi aclamado pela crítica e por colegas como Carlos Drummond; agora, o poeta das novas palavras manda notícias

Manoel de Barros e o jornalista Bosco Martins

Manoel de Barros vive em uma casa do centro de Campo Grande com a mulher, Stella. Aos 96 anos (já conta os 97) considera “um privilégio” ter chegado a esta altura, sem nunca precisar agradar ou bajular ninguém. Por conta da idade, Poeta diminuiu muito a sua produção. A idade trouxe ainda outros dissabores, como uma maior dificuldade para andar e a lentidão para escrever, agora, segundo ele, já em ritmo “baticum gererê”.

O poeta faz poesia, a lápis (ou com uma bic), usando a mão esquerda possui alguns dedos “adormecidos”. Mantém sua letra miúda e justifica: “Não sei de máquina. E ignoro computador. Cheguei Antes”.

Em seu escritório continua a reunir seus tesouros: as fotos do pai João Wenceslau e da mãe Alice, uma pequena biblioteca com os livros preferidos, dicionários, a escrivaninha, vários pequenos cadernos com anotações, tocos de lápis etc., onde cria: relendo e escrevendo, ouvindo música clássica ou fazendo sua contemplação em sua lida diária.

Fechado pro mundo

Sempre foram freqüentes minhas visitas ao Manoel, nos últimos 30 anos. Na mais recente, desfiz, enfim a preocupação de uma outra ida à casa dele, quando não consegui vê-lo e fui recebido apenas pela filha Martha, também minha amiga. Era só uma “constipação”.

Manoel de Barros mantém a vivacidade de seus pequenos olhos pretos. O sorriso inesquecível do Poeta e a cordialidade mineira de Stella, sua mulher há mais de 60 anos, continuam os mesmos.

Degustamos o pão de queijo oferecido por Stella, acompanhado do seu saboroso cafezinho. O Poeta mantém o hábito de antes do almoço tomar sua dose diária de destilado, com a única diferença de ter trocado as talagadas da pinga mineira por uísque com água de coco, orientação, segundo ele, de seu médico. O artista tem comido pouco. Gosta de ovo, arroz, carne, feijão, acompanhados sempre de fruta. Fazem parte de sua rotina sete netos, cinco bisnetos e duas funcionárias que se revezam nos afazeres domésticos.

Martha, que mora no Rio, também vê sempre os pais, cercados que estão pela lembrança do outro filho, João, morto em acidente de avião em 2008. Manoel de Barros tem saído raramente de casa e só permite abrir as portas de sua residência para os familiares. Se comove muito quando revê algum amigo. Pessoa de uma delicadeza natural, estremece emocionalmente quando admiradores se aproximam. Houve um tempo em que atendia todo mundo, mas já não consegue.

O moço filho de fazendeiro, que estudou pintura e cinema em Nova York, é hoje o ancião que mais vende poesia no Brasil. Os livros dele também vendem bem na Europa, onde tem seguidores principalmente em Portugal. Por essas e outras é que o poeta fica cada vez mais fechado para o mundo. “Ele nasceu sem arrebentar a bolsa d água”, diz Stella, para explicar a estrela original do pantaneiro/cuiabano. E, é certo, ganhou “o dom” de Deus.

Luto: Na última segunda-feira, 13 de agosto, o poeta perdeu seu filho mais velho, Pedro Costa Cruz Leite de Barros, aos 65 anos, que tentava se recuperar de seu terceiro AVC. O outro filho, João Wenceslau, perdeu em acidente, no ano de 2008.

(*) Bosco Martins é jornalista.

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